terça-feira, 24 de janeiro de 2012

MUDANÇAS


O tempo é impiedoso. Passa para todos e traz consigo os ventos da mudança, seja esta para melhor ou pior. E como as coisas mudam. Mudam de foco, de perspectiva, de interpretação. Quando eu era pequeno, chegava ao sítio dos meus pais e qualquer novidade me trazia espanto, alegria. Era uma festa para nós, crianças, chegar ao sítio e descobrir um pequeno cacho de uvas, ainda verdes e azedas, na singela parreira que brotou sobre o estacionamento de bambus. Eram tempos alegres e inocentes. Sem as responsabilidades e preocupações que os adultos enfrentam. Incrível como perdemos a sensibilidade ao longo dos anos. Hoje em dia, só ficaria impressionado se encontrasse um orangotango albino dependurado naquela parreira. Lembro que ficávamos horas em frente ao laguinho, desperdiçando minhocas, goiabas, ração de galinha e outros tipos inusitados de isca. Os mosquitos nos atacando sem piedade, o sol torrando as nossas peles e apenas algumas piabinhas se atreviam a mordiscar o anzol. Atualmente, se houvesse tempo livre na minha tumultuada agenda, e se eu tivesse interesse em pescarias, adotaria técnicas mais efetivas, como dinamite, cartuchos calibre 12 ou simplesmente iria ao jardim japonês munido de miolo de pão e um tijolo para acertar na cabeça das carpas assim que viessem à tona. Que perda de tempo. E pensar que ficávamos na varanda até tarde e por várias vezes ficamos ali parados, fitando o céu, procurando discos voadores. As estrelas eram tão bonitas... Será que ainda estão lá? Tanto tempo sem olhar para o céu. Procurando discos voadores, pois sim. Até parece aquela música do Caetano, que fala sobre seu exílio. Nunca entendi se ele estava vendo quatro discos voadores ou se estava procurando discos voadores. O idioma inglês sempre foi muito complicado para mim. Ele fala “looking for” ou “looking four”? Não sei. Talvez ninguém saiba. Hoje ninguém sabe e nem quer saber de nada. O mundo perdeu sua magia. Uma amiga da minha mãe fazia um truque idiota quando eu era criança. Aquele de fingir que tirou o próprio dedo. Na época eu achava o máximo. Hoje tenho raiva dela. Fazer-me de bobo daquele jeito. Deveria se envergonhar. Os adultos são uns cretinos. Contam histórias fantásticas para as crianças e não acreditam em nada que elas inventam. Quando meu pai me disse que o Coelho da Páscoa viria naquela noite, eu acreditei. Quando eu disse que foi ele que fez xixi na minha cama, ninguém acreditou. E ainda riram de mim. E usaram aquela filmadora velha do meu tio para gravar a minha versão da história. Até hoje eles exibem o filme nas noites de natal... E o natal é outra palhaçada! Na época era até divertido. Íamos dormir e quando acordávamos havia presentes na sala. E todos sabiam que o Papai Noel esteve ali. E nossos pais ficavam ali rindo e contando histórias do bom velhinho. Hoje em dia o natal não me traz o mesmo encantamento de outrora. Muito pelo contrário. A idéia de alguém invadir a minha casa na calada da noite é tão sombria que comecei a dormir com um taco de beisebol debaixo do travesseiro. Imaginem se eu vou buscar um copo d’água e esbarro com um estranho na minha sala carregando uma caixa? Papai Noel ou ladrão, vai tomar uma cacetada que não vai esquecer tão cedo.

Autoria: O chinelo da minhoca

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