Burócria era o país mais burocrático
do mundo. E a burocracia era tão grande que tornava tudo muito lento e difícil.
Numa bela manhã, um criminoso que
estava detido na penitenciária decidiu escapar. Ele preencheu um requerimento
de fuga em três vias, pegou o carimbo de autorização, entrou na fila do
despacho, despachou o requerimento e começou a cavar um túnel.
Percebendo que o bandido estava
tentando fugir, um dos guardas preencheu uma ficha de autorização em duas vias
para poder apertar o botão do alarme. A ficha de autorização foi levada para a
sala do subsecretário do diretor do presídio, que tirou uma fotocópia da ficha,
carimbou com o carimbo “urgente” e a enviou para o secretário do diretor. O
secretário recebeu a cópia da ficha, tirou outra cópia, carimbou com o carimbo
“prioridade máxima” e a deixou sobre a mesa, pois o seu relógio deu o sinal de
meio-dia. Ele saiu para almoçar.
O prisioneiro já estava no meio do
caminho para a liberdade. Outros presos queriam ajudar na escavação, mas a moça
que trabalhava no guichê de autorização de fugas estava muito ocupada para
atendê-los. Ela estava desenhando flores nas unhas com esmalte colorido.
O secretário voltou do almoço e
levou a cópia da ficha de autorização do alarme para a sala do diretor e a
deixou sobre a mesa, pois o diretor estava no banheiro, enviando um fax para
Boston.
O criminoso terminou o seu túnel de
fuga, preencheu um comprovante de conclusão de obras subterrâneas e saiu correndo
em direção à cidade.
O diretor do presídio saiu do
banheiro, pegou a cópia da ficha, carimbou com o carimbo “deferido”, entregou
para o secretário e voltou para o banheiro, pois ainda precisava despachar
alguns toletes para o rio.
O secretário enviou a ficha para o
subsecretário, que despachou para o setor do alarme. O guarda recebeu a
autorização, entregou um recibo para o subsecretário e apertou o botão do
alarme.
Os outros guardas do presídio, que
estavam tomando um cafezinho, ouviram o alarme e se encaminharam lentamente (foram andando, pois no corredor havia um aviso de "proibido correr no corredor") para a sala de recados, onde estava
afixado o memorando que explicava com detalhes a tentativa de fuga do
prisioneiro. Então os guardas se dirigiram para o depósito de armas, protocolaram
um aviso de retirada de material e pegaram suas espingardas. Vasculharam todos
os arredores, mas o homem já estava longe quando o alarme tocou. O diretor do
presídio foi obrigado a enviar um ofício para o chefe de polícia local, solicitando
ajuda para a captura do fugitivo.
O prisioneiro foragido teve uma
ótima ideia. Entrou numa papelaria e roubou uma folha de cartolina branca e uma
caneta. Escreveu em letras garrafais “CIRCULAR DE LEITURA OBRIGATÓRIA” e afixou
a folha ao lado de um sinal de trânsito. Alguns minutos depois, um motorista
parou seu carro no sinal e desceu para ler o que estava escrito na folha. O
fugitivo aproveitou para entrar no carro e fugir.
O chefe de polícia recebeu o ofício,
carimbou com o carimbo “de acordo” e entregou a mensagem para o seu escrivão,
que a enviou para o escrivão do delegado, que a entregou em mãos para o
delegado. O delegado percebeu que era preciso agir com rapidez. Elaborou um
memorando pedindo prioridade nas investigações e se reuniu com toda a força
policial durante o cafezinho da tarde, exigindo que todos se empenhassem ao
máximo para capturar o fugitivo.
O fugitivo estava quase chegando à
fronteira do país. Sabia que precisaria apresentar documentos, passaporte,
carimbar o visto, fazer um requerimento para deixar o país, aguardar
deferimento, confeccionar um novo cartão de vacinação, tomar uma vacina contra
febre amarela, preencher uma guia de viagem, carimbar a guia, entre outras
obrigações. Quando se lembrou que não estava carregando nenhum documento, resolveu
desburocratizar geral e atravessou a fronteira com carro e tudo, quebrando as
barreiras de proteção.
A polícia recebeu um ofício que
informava sobre a fuga internacional do prisioneiro. O ofício foi despachado
para o escrivão do chefe de polícia. Após o intervalo da tarde, o escrivão
enviou o ofício para o chefe de polícia, que agiu de imediato. Protocolou um
pedido de ajuda internacional e prometeu entrar em contato com as forças policiais
do país vizinho assim que terminasse o feriado prolongado.
Autoria = O chinelo da minhoca
Ilustração = Tony (cartunista) - desenho retirado da internet
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