quinta-feira, 1 de novembro de 2012

BURÓCRIA



            Burócria era o país mais burocrático do mundo. E a burocracia era tão grande que tornava tudo muito lento e difícil.
            Numa bela manhã, um criminoso que estava detido na penitenciária decidiu escapar. Ele preencheu um requerimento de fuga em três vias, pegou o carimbo de autorização, entrou na fila do despacho, despachou o requerimento e começou a cavar um túnel.
            Percebendo que o bandido estava tentando fugir, um dos guardas preencheu uma ficha de autorização em duas vias para poder apertar o botão do alarme. A ficha de autorização foi levada para a sala do subsecretário do diretor do presídio, que tirou uma fotocópia da ficha, carimbou com o carimbo “urgente” e a enviou para o secretário do diretor. O secretário recebeu a cópia da ficha, tirou outra cópia, carimbou com o carimbo “prioridade máxima” e a deixou sobre a mesa, pois o seu relógio deu o sinal de meio-dia. Ele saiu para almoçar.
            O prisioneiro já estava no meio do caminho para a liberdade. Outros presos queriam ajudar na escavação, mas a moça que trabalhava no guichê de autorização de fugas estava muito ocupada para atendê-los. Ela estava desenhando flores nas unhas com esmalte colorido.
            O secretário voltou do almoço e levou a cópia da ficha de autorização do alarme para a sala do diretor e a deixou sobre a mesa, pois o diretor estava no banheiro, enviando um fax para Boston.
          O criminoso terminou o seu túnel de fuga, preencheu um comprovante de conclusão de obras subterrâneas e saiu correndo em direção à cidade.
            O diretor do presídio saiu do banheiro, pegou a cópia da ficha, carimbou com o carimbo “deferido”, entregou para o secretário e voltou para o banheiro, pois ainda precisava despachar alguns toletes para o rio.
            O secretário enviou a ficha para o subsecretário, que despachou para o setor do alarme. O guarda recebeu a autorização, entregou um recibo para o subsecretário e apertou o botão do alarme.
            Os outros guardas do presídio, que estavam tomando um cafezinho, ouviram o alarme e se encaminharam lentamente (foram andando, pois no corredor havia um aviso de "proibido correr no corredor") para a sala de recados, onde estava afixado o memorando que explicava com detalhes a tentativa de fuga do prisioneiro. Então os guardas se dirigiram para o depósito de armas, protocolaram um aviso de retirada de material e pegaram suas espingardas. Vasculharam todos os arredores, mas o homem já estava longe quando o alarme tocou. O diretor do presídio foi obrigado a enviar um ofício para o chefe de polícia local, solicitando ajuda para a captura do fugitivo.
            O prisioneiro foragido teve uma ótima ideia. Entrou numa papelaria e roubou uma folha de cartolina branca e uma caneta. Escreveu em letras garrafais “CIRCULAR DE LEITURA OBRIGATÓRIA” e afixou a folha ao lado de um sinal de trânsito. Alguns minutos depois, um motorista parou seu carro no sinal e desceu para ler o que estava escrito na folha. O fugitivo aproveitou para entrar no carro e fugir.
            O chefe de polícia recebeu o ofício, carimbou com o carimbo “de acordo” e entregou a mensagem para o seu escrivão, que a enviou para o escrivão do delegado, que a entregou em mãos para o delegado. O delegado percebeu que era preciso agir com rapidez. Elaborou um memorando pedindo prioridade nas investigações e se reuniu com toda a força policial durante o cafezinho da tarde, exigindo que todos se empenhassem ao máximo para capturar o fugitivo.
            O fugitivo estava quase chegando à fronteira do país. Sabia que precisaria apresentar documentos, passaporte, carimbar o visto, fazer um requerimento para deixar o país, aguardar deferimento, confeccionar um novo cartão de vacinação, tomar uma vacina contra febre amarela, preencher uma guia de viagem, carimbar a guia, entre outras obrigações. Quando se lembrou que não estava carregando nenhum documento, resolveu desburocratizar geral e atravessou a fronteira com carro e tudo, quebrando as barreiras de proteção.
            A polícia recebeu um ofício que informava sobre a fuga internacional do prisioneiro. O ofício foi despachado para o escrivão do chefe de polícia. Após o intervalo da tarde, o escrivão enviou o ofício para o chefe de polícia, que agiu de imediato. Protocolou um pedido de ajuda internacional e prometeu entrar em contato com as forças policiais do país vizinho assim que terminasse o feriado prolongado. 

Autoria = O chinelo da minhoca
Ilustração = Tony (cartunista) - desenho retirado da internet

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